Bruce springsteen: verdade e ficção no novo filme biográfico

O mundo dos filmes biográficos musicais é frequentemente palco de liberdades criativas, com eventos e personagens distorcidos para fins dramáticos. Queen, Elton John, Amy Winehouse e Bob Dylan são apenas alguns dos artistas cujas histórias foram recontadas com desvios da realidade. Até mesmo “Weird Al” Yankovic inspirou-se nessa tendência para criar uma biografia totalmente fantasiosa, culminando em um assassinato no Grammy.

No entanto, algumas produções se destacam por sua fidelidade aos fatos. Em 2014, o filme sobre Brian Wilson, “The Beach Boys: Uma História de Sucesso”, surpreendeu pela precisão, apesar de algumas alterações na linha do tempo. Agora, o filme “Springsteen: Salve-Me do Desconhecido” segue essa linha, apresentando uma narrativa surpreendentemente autêntica.

Diferente de cinebiografias abrangentes, “Salve-Me do Desconhecido” foca em um período específico da vida de Bruce Springsteen: entre 1981 e 1982. A trama acompanha a gravação do álbum “Nebraska”, a decisão de lançá-lo sem alterações e a luta do artista contra a depressão e a dificuldade em se conectar emocionalmente. O filme também explora as memórias de Springsteen sobre os anos 1950 e seu relacionamento complexo com o pai.

A proximidade de Springsteen com o projeto, presente no set durante a maior parte das filmagens, contribuiu para a fidelidade da produção. Em vez de focar em imprecisões, esta análise destaca os acertos do filme, que soube capturar a essência daquele momento crucial na vida do artista.

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O filme inicia nos anos 50, com a mãe de Springsteen enviando o jovem Bruce a um bar para buscar o pai. Essa cena, aparentemente cinematográfica, é retirada do próprio show solo de Springsteen na Broadway, onde ele descrevia a experiência de entrar no mundo adulto e masculino do bar.

A narrativa avança para 14 de setembro de 1981, no Riverfront Coliseum, em Cincinnati, a última parada da turnê “River”. Springsteen, interpretado por Jeremy Allen White, performa “Born to Run”. O filme retrata corretamente o encontro de Springsteen com o empresário Jon Landau após o show, que lhe entrega as chaves de uma casa alugada em Colts Neck, Nova Jersey, onde “Nebraska” seria gravado.

Em 1982, Springsteen realizou shows não anunciados no Stone Pony e outros bares de Nova Jersey. No filme, ele é visto tocando “Lucille” no Pony antes mesmo de começar a gravar “Nebraska”. Embora a cronologia não seja exata, a música fazia parte de seu repertório ao vivo.

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Um dos poucos desvios da realidade é a personagem Faye Romano, interpretada por Odessa Young, uma jovem mãe solteira com quem Springsteen se envolve. Ela é uma figura composta, representando diversas namoradas que o cantor teve na época.

O filme retrata a dificuldade de Springsteen em se conectar com mulheres, um tema abordado em sua autobiografia “Born to Run”. Ele descreve sua tendência a se afastar de relacionamentos quando se aproximava da vulnerabilidade emocional.

Outro momento marcante é a cena em que o jovem Springsteen ataca o pai com um taco de beisebol para proteger a mãe, um evento real descrito em suas memórias.

“Terra de Ninguém”, de Terrence Malick, inspirou Springsteen a escrever a faixa-título de “Nebraska”. O filme mostra Springsteen assistindo ao filme e pesquisando sobre os assassinatos de Charles Starkweather, que o influenciaram na composição.

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Springsteen gravou “Nebraska” em um gravador de quatro canais em um quarto, com a ajuda de seu técnico de guitarra Mike Batlan, que montou o equipamento e gravou Springsteen sentado em uma cama.

O roteirista Paul Schrader deu a Springsteen a ideia de chamar uma música de “Born in the U.S.A.”. Schrader havia escrito um roteiro com esse título e o mostrou a Jon Landau na esperança de que Springsteen interpretasse um dos papéis.

A E Street Band tentou gravar as músicas de “Nebraska”, mas as versões elétricas foram consideradas inferiores às demos originais, capturando a atmosfera e a crueza que Springsteen buscava.

Springsteen também gravou várias músicas do “Born in the U.S.A.” na mesma época que “Nebraska”. O filme mostra Landau incentivando Springsteen a lançar um álbum com “Born in the U.S.A.” como tema principal.

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O pai de Springsteen foi preso e desapareceu por três dias em Los Angeles, um evento descrito em suas memórias. Além disso, Douglas Springsteen sofria de problemas de saúde mental, algo que Bruce revelou apenas após a morte do pai.

Após terminar “Nebraska”, Springsteen viajou pelo país com seu amigo Matt Delia, dirigindo para Los Angeles, onde ele permaneceria por grande parte da década seguinte. O filme inclui uma cena em que Springsteen se emociona em uma feira de condado, um momento descrito em seu livro.